sexta-feira, 19 de julho de 2013

Estádio versus Arena


- Dois reais, o amendoim? Que absurdo!!!”.

- Amigo, este é amendoim de arena, não é de estádio, retruquei ao consumidor indignado com o preço do pacote de amendoim cobrado por um pobre menor vendedor que, contrariando “normas da FIFA”, se aventurava a vender sua mercadoria às cercanias da Arena Itaipava. Não sabendo ele - o consumidor. Ou sabia? - dos preços cobrados no interior da arena.

Alguém próximo a mim, após um dos jogos da Copa das Confederações, comentou com assombro:

- Não vi negros no estádio!

A propósito, Afonsinho, poucos sabem de quem se trata, ex-jogador dos idos 70, diferenciado; aliás, bem diferenciado, do estereótipo do jogador de futebol. Ele, naqueles anos difíceis, quando muitos se escondiam no silêncio, misto de jogador e acadêmico de medicina, já emitia suas opiniões, e foi o primeiro jogador, ao que me parece, na História do futebol brasileiro a obter passe-livre, numa conjuntura em que a relação empregador(clube) / empregado(jogador) era completamente desfavorável à última das partes, por causa do “passe-preso”. Bem, em recente crônica ele aconselha a Neguinho da Beija-Flor a alterar o refrão do seu samba que diz “Domingo eu vou ao Maracanã” para “Domingo eu não vou ao Maracanã“, em razão, acredito eu, da cor da sua pele/origem pobre - de Neguinho. “No cenário da elitização do futebol, penso em sugerir ao Neguinho da Beija-Flor que mude a letra do samba”, escreveu Afonsinho.

Voltando ao assombro do meu próximo, veja-se que, pelo linguajar e pelo próprio estranhamento, se trata de pessoa subdesenvolvida; pessoa do terceiro mundo; pessoa completamente alienígena com relação ao primeiro mundo e, ainda, com o “padrão Fifa”.

Pois bem, começo com este arrodeio para dizer que, por uma deferência toda especial de Rodrigo - uma das minhas três joias - compareci à Arena Itaipava  (Fonte Nova) para assistir aos três jogos da Copa das Confederações programados para ali. E, me senti como se fora um alienado completo, ao viver toda aquela atmosfera em que me vi envolvido, atropelado.

Ah! Bons tempos em que eu resolvia entrar por onde bem quisesse; a escolher uma dentre as dezenas de catracas que a “velha Fonte” nos oferecia e sentava onde bem entendesse; de trocar de lugar conforme as conveniências, tantas vezes quanto achasse necessário e muitas amizades e conhecimento entre pessoas foram feitas pelo convívio no estádio.

Naquele planeta, o planeta da Fifa, não! O lugar é previa e obrigatoriamente determinado e comportadamente devo manter-me por todo o tempo. De posse do ticket – ai que chique!- sou conduzido, como um bovino em direção ao curral, por vaqueiros, digo, voluntários, em geral, jovens, devidamente uniformizados, com megafones ou não e em estruturas montadas acima da superfície ou mesmo na própria superfície, para uma espécie de labirinto, sim, L..a..b..i..r..i..n..t..o! De onde num vai e vem incessante e praticamente, como se andando e chegando a lugar algum, para avançar pouquinho a cada volta – esforço que buliu com o meu labirinto - sem trocadilho, hein! - consigo eliminar a etapa labiríntica e, hã, pensa que cheguei? Ledo engano. Inicia-se nova fase com outros voluntários indicando os portões, são muitos os portões; os níveis, a arena tem três níveis de arquibancadas; os blocos, são inúmeros; as fileiras e – ufa! - finalmente posso encontrar o meu assento; este pessoal e intransferível.

Bem, o jogo em si não é tão diferente dos que se assistem dos estádios, mas não há mais lugar para apostadores, torcedores em grupos organizados, para os mais absurdos hábitos do tradicional frequentador de estádio de futebol. Não há mais lugar para pretos, para pobres, vendedores ambulantes, baiana de acarajé, do churrasquinho de gato, do isopor. Que saudade dos antigos bares, onde bebíamos e podíamos papar pratos populares, gostosamente elaborados.

Os estádios, com toda aquela áurea própria e espontaneamente feita pela gente do povo, gente que fez a extrema popularidade e o imenso poder deste esporte, estão sendo inexoravelmente substituídos.  

O futebol, que foi um esporte eminentemente da escol em seus primórdios. No padrão-Fifa, parece estar sendo submetido a um processo de retorno às origens, extinguindo os populares estádios, segregando os populares espectadores.

Nada restará de material (atenção para o real sentido do vocábulo) da Fonte Nova, do Mineirão, do Maracanã... a não ser o patrimônio imaterial tombado na lembrança das gerações que os conheceram e deles usufruiram.

Ainda bem que poderei contar por mais algum tempo com o meu Barradão.