- Dois reais, o amendoim? Que
absurdo!!!”.
- Amigo, este é amendoim de
arena, não é de estádio, retruquei ao
consumidor indignado com o preço do pacote de amendoim cobrado por um pobre
menor vendedor que, contrariando “normas da FIFA”, se aventurava a vender sua
mercadoria às cercanias da Arena Itaipava. Não sabendo ele - o consumidor. Ou
sabia? - dos preços cobrados no interior da arena.
Alguém próximo a mim, após um dos
jogos da Copa das Confederações, comentou com assombro:
- Não vi negros no estádio!
A propósito, Afonsinho, poucos sabem
de quem se trata, ex-jogador dos idos 70, diferenciado; aliás, bem
diferenciado, do estereótipo do jogador de futebol. Ele, naqueles anos
difíceis, quando muitos se escondiam no silêncio, misto de jogador e acadêmico
de medicina, já emitia suas opiniões, e foi o primeiro jogador, ao que me
parece, na História do futebol brasileiro a obter passe-livre, numa conjuntura
em que a relação empregador(clube) / empregado(jogador) era completamente
desfavorável à última das partes, por causa do “passe-preso”. Bem, em recente
crônica ele aconselha a Neguinho da Beija-Flor a alterar o refrão do seu samba
que diz “Domingo eu vou ao Maracanã”
para “Domingo eu não vou
ao Maracanã“, em razão, acredito eu, da cor da sua pele/origem
pobre - de Neguinho. “No cenário da elitização do futebol, penso em sugerir ao Neguinho da
Beija-Flor que mude a letra do samba”, escreveu
Afonsinho.
Voltando ao assombro do meu próximo,
veja-se que, pelo linguajar e pelo próprio estranhamento, se trata de pessoa
subdesenvolvida; pessoa do terceiro mundo; pessoa completamente alienígena com
relação ao primeiro mundo e, ainda, com o “padrão Fifa”.
Pois bem, começo com este arrodeio
para dizer que, por uma deferência toda especial de Rodrigo - uma das minhas
três joias - compareci à Arena Itaipava (Fonte
Nova) para assistir aos três jogos da Copa das Confederações programados para
ali. E, me senti como se fora um alienado completo, ao viver toda aquela
atmosfera em que me vi envolvido, atropelado.
Ah! Bons tempos em que eu resolvia entrar
por onde bem quisesse; a escolher uma dentre as dezenas de catracas que a “velha
Fonte” nos oferecia e sentava onde bem entendesse; de trocar de lugar conforme
as conveniências, tantas vezes quanto achasse necessário e muitas amizades e
conhecimento entre pessoas foram feitas pelo convívio no estádio.
Naquele planeta, o planeta da Fifa,
não! O lugar é previa e obrigatoriamente determinado e comportadamente devo
manter-me por todo o tempo. De posse do ticket
– ai que chique!- sou conduzido, como um bovino em direção ao curral, por
vaqueiros, digo, voluntários, em geral, jovens, devidamente uniformizados, com
megafones ou não e em estruturas montadas acima da superfície ou mesmo na
própria superfície, para uma espécie de labirinto, sim, L..a..b..i..r..i..n..t..o!
De onde num vai e vem incessante e praticamente, como se andando e chegando a
lugar algum, para avançar pouquinho a cada volta – esforço que buliu com o meu labirinto - sem
trocadilho, hein! - consigo eliminar a etapa labiríntica e, hã, pensa que
cheguei? Ledo engano. Inicia-se nova fase com outros voluntários indicando os
portões, são muitos os portões; os níveis, a arena tem três níveis de
arquibancadas; os blocos, são inúmeros; as fileiras e – ufa! - finalmente posso
encontrar o meu assento; este pessoal e intransferível.
Bem, o jogo em si não é tão diferente
dos que se assistem dos estádios, mas não há mais lugar para apostadores,
torcedores em grupos organizados, para os mais absurdos hábitos do tradicional
frequentador de estádio de futebol. Não há mais lugar para pretos, para pobres,
vendedores ambulantes, baiana de acarajé, do churrasquinho de gato, do isopor. Que saudade dos antigos bares, onde bebíamos e podíamos papar
pratos populares, gostosamente elaborados.
Os estádios, com toda aquela áurea
própria e espontaneamente feita pela gente do povo, gente que fez a extrema
popularidade e o imenso poder deste esporte, estão sendo inexoravelmente substituídos.
O futebol, que foi um esporte
eminentemente da escol em seus primórdios. No padrão-Fifa, parece estar sendo
submetido a um processo de retorno às origens, extinguindo os populares
estádios, segregando os populares espectadores.
Nada restará de material (atenção para
o real sentido do vocábulo) da Fonte Nova, do Mineirão, do Maracanã... a não ser
o patrimônio imaterial tombado na lembrança das gerações que os conheceram e
deles usufruiram.
Ainda bem que poderei contar por mais
algum tempo com o meu Barradão.